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domingo, 14 de fevereiro de 2010

O Aero Boero "Flex" do DCTA

Disponível em grandes quantidades no Brasil, o álcool etílico carburante tornou o país um pioneiro no uso de combustíveis renováveis, não derivados do petróleo, e movimenta milhões de motores de automóveis em todos os Estados brasileiros.
O uso do álcool no Brasil, como combustível de automóveis, começou por iniciativa do Governo Federal, em 1975, depois da Crise do Petróleo. Naquela época, o Brasil precisava urgentemente reduzir as importações de petróleo, que estavam consumindo divisas em uma época na qual a balança de pagamentos estava francamente desfavorável para o Brasil. Apesar da pressa com que foi implantado, o programa do álcool, denominado Pro-Álcool, foi bem sucedido, especialmente após a Segunda Crise do Petróleo de 1979, e por volta de 1982, a grande maioria dos carros produzidos no Brasil eram movidos à álcool.

No desenvolvimento do motor a álcool brasileiro, grande importância teve o Centro Técnico Aeroespacial - CTA, organização pertencente ao então Ministério da Aeronáutica. Foi no CTA que foi criado o primeiro carro a álcool brasileiro, um Dodge 1800 Polara, graças ao trabalho desenvolvido pelo engenheiro aeronaútico Ernesto Urbano Stumpf, em 1975. O carro ainda é carinhosamente conservado no CTA até hoje.

O álcool revelou ter grandes vantagens, por ser mais barato e bem menos poluente que a gasolina, além de outras qualidades, como permitir maiores taxas de compressão, mais potência e menos contaminação do lubrificante. Todavia, no início dos anos 90 houve crises sucessivas de desabastecimento, causadas principalmente pela diminuição da produção do álcool em favor da produção de açúcar, quando esse produto estava em alta no mercado internacional. O preço do álcool também costuma subir bastante em épocas de entressafra, tornando seu uso menos econômico que o da gasolina.

As crises desencorajaram muitos usuários de carro a álcool, e aumentou novamente a produção de carros a gasolina. Os fabricantes nacionais de automóveis desenvolveram, durante os anos 90, uma tecnologia que permitia o uso dos dois combustíveis, indiferentemente, eliminando-se o inconveniente dos aumentos de preço do álcool na entressafra e do risco de desabastecimento do produto. Entretanto, devido a problemas na legislação, só no início de 2003 é que a Volkswagen lançou o primeiro veículo "Flex" brasileiro, o Gol Flex. Foi seguido quase imediatamente pela maioria da concorrência.

Um motor "Flex" tem a característica principal de funcionar tanto com álcool quanto gasolina, inclusive se misturados em qualquer proporção. Os ajustes de mistura necessários são feitos eletronicamente pelo sistema de injeção e de ignição do motor, sem qualquer interferência do motorista.

Prático, o sistema inspirou novamente o CTA, hoje denominado Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial, que começou a desenvolver um motor "Flex" para uso na Força Aérea Brasileira. Na verdade, desde 1985 o CTA desenvolvia um motor a álcool para avião, que chegou a voar equipando a aeronave Neiva T-25 1904 da FAB, o primeiro avião a álcool brasileiro, depois de 520 horas de testes no solo. Na época, entretanto, ocorreram as primeiras crises de desabastecimento e o programa foi suspenso.

O projeto foi retomado em 2004, já que os carros "Flex" estavam fazendo sucesso, os preços do petróleo voltaram a subir no mercado internacional e o álcool estava amplamente disponível em qualquer lugar do país.

O DCTA fez uma parceria com a empresa Magnetti Marelli, uma subsidiária da Fiat especializada em sistemas de ignição e injeção eletrônica. O projeto tem o objetivo de desenvolver um motor "flex" para uso nos aviões de treinamento Neiva T-25 Universal, o principal avião de motor convencional em uso na Força Aérea Brasileira.

Embora exista um motor a álcool disponível para o T-25, produzido e patenteado pela Embraer, atualmente usado nos aviões agrícolas Ipanema, o DCTA optou por desenvolver seu próprio projeto, que contempla uma modificação muito mais radical nos motores do que a adaptação feita pela Embraer nos seus motores. De fato, a Embraer optou por mínimas modificações no motor Lycoming IO-540 original, sem sequer alterar a taxa de compressão do motor, e mantendo praticamente o mesmo sistema de injeção mecânica de combustível e a ignição por magneto.

No projeto do DCTA/Magnetti Marelli, a modificação nos motores é muito mais radical. Elimina-se totalmente o carburador e os magnetos. Um sistema eletrônico integrado de ignição e injeção, bastante semelhante ao utilizado nos motores automotivos "Flex" atuais, substitui aqueles obsoletos conjuntos, proporcionando não apenas maior economia, mas também maior confiabilidade, maior flexibilidade e maior facilidade de operação.
Embora o DCTA tenha escolhido uma aeronave T-25 (o FAB 1835, foto acima), como plataforma principal de testes, os engenheiros resolveram inicialmente desenvolver um motor de 4 cilindros, o Lycoming O-360 A1, que possui os mesmos cilindros do motor IO-540 do T-25, mas que por ter apenas 4 cilindros simplifica o sistema. Então, o programa adicionou um parceiro operacional, o Clube de Voo a Vela do CTA, que cedeu uma aeronave Aero Boero 180, usada como rebocador de planadores que tornou-se a primeira plataforma de testes do motor "Flex". É o primeiro Aero Boero "Flex".

O Aero Boero militar, praticamente igual aos Boeros 180 usados para rebocar planadores nos aeroclubes brasileiros, é atualmente a principal plataforma de testes do motor "Flex" aeronáutico brasileiro. O uso da ignição e da injeção eletrônica permite a eliminação do ajuste manual da mistura necessário nos motores a gasolina, e dessa forma o motor trabalha sempre com a mistura ideal, evitando contaminação do lubrificante com o combustível e proporcionando mais potência, eficiência e economia, além de menor poluição.

O DCTA pretende concluir os estudos relativos ao motor "Flex" aeronáutico durante o ano de 2010.

Embora trate-se, ainda, de uma tecnologia para aeronaves militares, que não são obrigadas a cumprir requisitos civis de certificação, o Aero Boero "Flex" do DCTA representa um desenvolvimento notável que, sem dúvida, poderá chegar ao mercado civil em breve e ser certificado. Aliás, a substituição da cara e poluente gasolina da aviação com chumbo já está na mira das autoridades ambientais, e as soluções devem aparecer em breve, sob pena de inviabilização da aviação leve a pistão.

A iniciativa do DCTA é especialmente interessante para os dirigentes dos aeroclubes brasileiros, atualmente muito preocupados com o alto preço da gasolina, que encarece o preço da hora de voo para os seus alunos. Mas, quem sabe. a frota de Aero Boeros dos aeroclubes não sejam equipados com motores "Flex" no futuro, para alegria dos candidatos a Piloto Privado brasileiros.

5 comentários:

  1. Interessantíssimo! Gosto de saber que nossas Universidades produzem alternativas viáveis para problemas importantes e que estes problemas importantes são solucionáveis com tecnologia brasileira.

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  2. Jonas, Boa Tarde. Como ficou estes estudos do DCTA sobre motores "flex"?

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    1. Devem ser péssimos o funcionamento, tal como ocorre em veículos Flex.

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    2. Pelo contrário, o funcionamento ficou extremamente suave... muito econômico, e funciona melhor com etanol. Meu carro também é flex, um Ford Ka, sem problemas até hoje, com 44 mil Km rodados.

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  3. O bom é poder eliminar de vez o chumbotetraetila ao usar o etanol, e assim a acidificação do óleo lubrificante e a deposição de cristais de chumbo nas velas tornam-se uma sombra de um passado sombrio...

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